Estudantes da Universidade Federal do Espírito
Santo (Ufes) denunciaram um professor por manifestar racismo durante uma aula
da turma do 2º período do curso de Ciências Sociais.
Professor do Departamento de Economia, Manoel Luiz
Malaguti cravou que “o nível da educação está tão baixo que o professor não
precisa se qualificar mais para dar aula, já que a maioria dos cotistas são
negros, pobres, sem cultura e sem leitura, são analfabetos funcionais”.
Ainda afirmou que “detestaria ser atendido por um
médico ou advogado negro”. Um dos que presenciaram a explanação racista foi
João Victor Santos, de 20 anos, cotista pelos critérios de raça e renda.
“Ele foi questionado por um aluno sobre o valor do
trabalho de um professor, se era justo, e aproveitou a deixa para falar de
educação. Ele aproveitou para fazer uma crítica ao sistema e falar que a
ingressão de cotistas na universidade diminuiu o nível da universidade”, disse
João Victor.
O discurso durou aproximadamente uma hora e foi
concluído com a afirmação de que ele “detestaria ser atendido por um médico ou
advogado negro”. No começo da aula havia cerca de 20 pessoas, mas à medida que
o professor falava os alunos foram se retirando, alguns nervosos e chorando.
Os estudantes registraram uma queixa na ouvidoria
da universidade e fizeram uma manifestação exigindo punição.
Primeiro desembargador negro do Espírito Santo,
Willian Silva ofereceu representação criminal ao Ministério Público Federal.
“Sinto-me com a dignidade e o decoro ofendidos na condição de jurista negro,
proveniente de família pobre, advogado atuante por vários anos antes do
ingresso na carreira da magistratura, e hoje o primeiro desembargador negro
capixaba”, falou.
Doutor em Teoria Econômica pela Universidade de
Picardie, na França, Malaguti é professor da Ufes desde 1995. Em entrevista ao
portal Gazeta Online, ele se defendeu.
“No meio de uma discussão sobre cotas e o sistema
educacional, eu coloquei que se eu tivesse que escolher entre dois médicos, um
branco e um negro, com o mesmo currículo, eu escolheria o branco. Por que que
eu escolheria o branco? Os negros, em média, vêm de sociedades, de comunidades
menos privilegiadas, para a gente não usar um termo mais forte, e nesse sentido
eles não têm uma socialização primária na família que os tornem receptivos aos
trâmites da universidade, à forma de atuação da universidade, aos objetivos da
universidade. Eles têm muito mais dificuldades para acompanhar determinadas
exposições. Eu não acho que é uma visão preconceituosa, acho que é bastante
realista”, disse.
“Então eu dei o exemplo do médico, mas não nesses
termos que eu detestaria, nunca falaria algo parecido. Eu diria simplesmente e
reafirmo que dois médicos com o mesmo currículo, com a mesma experiência, só
que um negro e um branco, em função da possibilidade estatística desse médico
branco ter tido uma formação mais preciosa, mais cultivada, eu escolheria um
médico branco. Mas como um exemplo do que a sociedade faz.”
Pausa para tomar ar.
O discurso é ainda mais pérfido por vir do servidor
de uma instituição de ensino pública. A opinião de Malaguti mostra que o
ingresso na universidade é só uma das muitas barreiras que os alunos cotistas
enfrentam no decorrer do curso.
João Victor participa de um grupo que pesquisa o
preconceito sofrido por cotistas na Ufes. Ele disse que há relatos de
professores que dividem a turma entre não cotistas e cotistas, chegando ao
absurdo de dar aulas em dias diferentes para cada grupo, e lembra que há outras
formas de discriminação mais difíceis de detectar. É comum, por exemplo,
acontecer confraternizações entre os alunos e os cotistas não serem convidados.
A Ufes passou a adotar o sistema de cotas sociais
em 2008 e desde 2013 adota também as cotas raciais.