Pesquisa realizada pelo Ministério da
Transparência, Fiscalização e Controlaria Geral da União (CGU) revela que, no
período de outubro de 2013 a dezembro de 2016, cerca de R$ 309 milhões de
recursos da saúde, educação, transporte e merenda escolar foram escamoteados
das prefeituras de municípios do Maranhão. A informação é do MA10,
que solicitou o levantamento.
De acordo coma reportagem, os números dizem
respeito apenas a desvios investigados em operações realizadas pela CGU em
conjunto com a Polícia Federal (PF) e o Ministério Público Federal (MPF). O
período corresponde ao primeiro mandato de prefeitos eleitos nas eleições
2012. Para o chefe da CGU no Maranhão, Francisco Alves Moreira, esses
desvios são apenas alguns dos que acontecem fora do raio de investigação dos
órgãos de controle.
“Esses são apenas alguns dados de esquemas que
conseguimos detectar e desarticular, em parceria com o MPF e a Polícia
Federal”, explica. “O nosso trabalho é constante, mas muitas condutas ilícitas
ainda são praticadas às escondidas e o rombo causado à economia dos municípios
do Maranhão é muito maior do que os dados que estamos quantificando”, alertou.
Para Francisco, é necessário articular, junto a
esses dados, os números do Ministério Público do Maranhão para se ter uma ideia
da quantidade de dinheiro desviado dos cofres públicos municipais.
Municípios
No período de 2013 a 2016, os desvios constatados
pela CGU durante as operações foram realizados nos municípios de São Luís,
Bacabal, Pedreiras, Zé Doca, Caxias, São João do Paraíso, Serrano do Maranhão,
Turilândia, Santa Luzia, Pedro do Rosário, Cajapió, Arari, Paulo Ramos,
Anajatuba, Imperatriz, São José de Ribamar, Paço do Lumiar, Humberto de Campos,
Aldeias Altas, Altamira do Maranhão, Timon, Caxias, Viana, São Mateus, Grajaú,
Coroatá, Peritoró, Rosário, Presidente Dutra, dentre outros.
Em São João do Paraíso, no ano de 2013, a CGU
constatou o desvio de recursos federais usados para o pagamento de operações de
agiotagem. As verificações em Bacabal e Zé Doca confirmaram, em suma, que
recursos públicos foram desviados de contas públicas para contas particulares
sem comprovação de despesas ou com comprovação irregular.
A Operação “Cheque Branco”, de 2013, aferiu a
existência de um esquema de agiotagem no Estado, em que estavam envolvidos
diversos gestores e ex-gestores municipais, empresários de diversos segmentos e
suas empresas. O esquema era movimentado e alimentado por meio do desvio de
recursos públicos federais destinados à educação e à saúde, em municípios como
Serrano do Maranhão, Turilândia, Santa Luzia, Arari, e outros.
Em 2014, na cidade de Anajatuba, prefeito e
secretários municipais se envolveram num esquema de fraudes em licitações que
desviava recursos públicos nas áreas de transporte, censo, alimentação e
reforma escolar, em especial em recursos do Fundeb. O rombo de R$ 30 milhões
foi denunciado a nível nacional.
Em outros municípios, a contratação de empresas de
“fachada”, prática conhecida pelos órgãos fiscalizadores, também favorecia o
enriquecimento ilícito de gestores.
Emissão de notas fiscais de favor; superfaturamento
por inexecução ou execução parcial e inadequada de obras e de serviços;
utilização de contas bancárias de “passagem”; atestados fraudulentos; montagens
de processos licitatórios; e prestação de informações fraudulentas no censo
escolar foram apenas alguns dos processos empregados pelas prefeituras para o
desvio das verbas.
Máfia do Lixo
Na mais recente operação da CGU, em parceria com a
PF e o MPF no Maranhão, foi constatado o uso indevido de mais de R$ 230 milhões
em 17 prefeituras maranhenses. As investigações do Ministério Público apontaram
que as prefeituras maranhenses estavam envolvidas em um esquema que desviou
cerca de R$ 170 milhões dos cofres públicos. Segundo representação do órgão,
houve irregularidades na contratação da Cooperativa Maranhense de Trabalho e
Prestação de Serviços (Coopmar) e mais de 10 empresas.
Ainda durante as investigações, foi apurado que a
Coopmar, ao longo de três anos, recebeu repasses de prefeituras na ordem de R$
230 milhões. As investigações começaram depois que o Ministério Público
verificou que a Coopmar aparecia como a empresa mais contratada para execução
de serviços de limpeza e outros serviços gerais em prefeituras do estado por
meio da contratação da cooperativa.
Foi observado o superdimensionamento da quantidade
de profissionais terceirizados, ausência de publicação da convocação, termo de
referência incompleto, ambíguo e impreciso e outras exigências que comprovem
autenticidade.
“O que acontece, nesses casos, é que as prefeituras
desviam dinheiro descaradamente por meio do serviço de limpeza”, explica o
promotor Lindonjonson, da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público e da
Probidade, do Ministério Público do Maranhão. “Esse tipo de enriquecimento é
muito comum em inúmeras prefeituras em todo o estado. É uma verdadeira máfia do
lixo, a partir de serviços de limpeza”, afirmou.
Ministério Público
O promotor Lindonjonson, explica que a conduta
ilícita dos gestores é recorrente e já foi constatada na maior parte dos 217
municípios maranhenses.
“A improbidade nos interiores é ainda maior porque
existe uma sensação, nesses lugares, de que a Justiça está longe”, avalia.
O promotor explica que os desvios no período
anterior ao avaliado pela CGU para esta reportagem, o rombo é ainda maior nas
prefeituras do Maranhão. De 2004 a 2013, cerca de R$ 661 milhões em multas e
ressarcimentos aos cofres públicos foi o montante encaminhado pelo Ministério
Público para a execução dos gestores com contas desaprovadas pelo Tribunal de
Contas do Estado (TCE).
“Estamos falando de mais de meio bilhão de reais”,
afirma Lindonjonson. “É apenas uma amostra da ferida que está aberta no modo de
fazer política no nosso estado”, completa.
O ressarcimento aos cofres públicos era buscado
pelo Ministério Público de duas formas principais. Em Ações Civis Públicas por
improbidade administrativa, quando há danos aos cofres públicos, o
ressarcimento é uma das penalidades previstas na própria lei. A outra forma
eram as Ações de Execução, que tinham por base as decisões do TCE a respeito de
contas irregulares.
Em 2014, no entanto, o STF decidiu que esse tipo de
Ação de Ressarcimento não seria atribuição do MP e sim dos próprios entes
públicos beneficiários. Ou seja, se um município X é condenado pelo Tribunal de
Contas, caberia ao próprio município cobrar o gestor ou ex-gestor por isso.
O procurador de justiça José Henrique Marques
Moreira lamentou a decisão do STF, assim que foi tomada. À época da decisão, o
procurador destacou a dificuldade estrutural e política que os municípios têm
para realizar esse tipo de trabalho. Segundo ele, a grande maioria dos
municípios não têm Procuradorias Gerais estruturadas.
O que diz a lei
De acordo com a Lei 8429/92. Existem 3 tipos de
atos de improbidade: enriquecimento ilícito, lesão ao erário e ato contra os
princípios da administração pública. Entre as sanções para os atos estão a
perda dos bens, ressarcimento integral do dano, perda da função pública,
suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil
de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com
o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios,
direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual
seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.